quarta-feira, 14 de janeiro de 2009

A lógica das relações humanas

Nós partimos. Sem despedidas e sem arrependimentos
apenas o vento passando como se quisesse dizer algo
mas o vento nada diz, pois é apenas vento
e assim partimos, sem despedidas e sem arrependimentos
iguais ao vento, sem significado ou conteúdo
como se partir ou ficar significasse tudo
e então a vida alcançasse o ápice da sua existência
é assim quando temos que decidir por nós mesmos
partir ou ficar, ser ou não ser
ah, que forma injusta de viver
tão mecanicamente criados, tão controlados nas sensações
que de tão científico são os termos oferecidos
que, majestosamente os chamamos "termos científicos"
mas pena, esqueceram de embutir na programação
como agir, reagir, sentir e não sentir
entramos em colapso: não sabemos o que fazer
e o paradoxo materialista dos sentimentos orgânicos
escapa ao controle, não temos respostas
ou a definição metódica do pai dos burros
"siga o que seu coração dizer" ah, que conveniente
na muleta divina me oferece respaldo?
na simplicidade supersticiosa é que se embasa?
e eu e nós que somente queríamos ser o que somos
sem ser o que somos, mas pertencentes ao meio
descobrimos que poucos somos o que desejávamos
sendo menos parte de um todo do que do nada
e vago agora entre os pensamentos que tento
diferenciar quais são meus e quais não são
de tão tétrico que se tornaram os sentimentos
não sei responder se a partida ou a permanência
valem à pena ou são em vão
como amantes que desejosos na luxúria
desejam-se, mas não sabem o motivo
e partem como se nunca tivessem partido
e se unem como se houvesse motivo
sem se conhecer, sem se compreender
e a estática das relações humanas encontra uma razão
a lógica aristotélica e nada mais.

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Conto de fadas capitalista

Uma vez em uma cidade
um palhaço um dia veio
e se espantou com a tristeza das pessoas
a cidade toda cinza, sem música ou alegria
as expressões sérias, as janelas fechadas
as crianças trancadas em casa e sem animais andando pelas ruas
E o palhaço não conseguia acreditar no que via
“o que acontece com essa cidade
que não tem cor, que não tem riso e vida?
não entendem que o certo é viver
cada dia, cada momento
com prazer, amor e felicidade?”
E então tocou forte sua buzina
chamando a atenção dos moradores que passavam
“cá estou, o palhaço Jotalhão
faço piruetas, planto bananeira
dou cambalhotas e me estatelo no chão
conto piadas, truques de magia e cabriolagens
imito um macaco e corro de quatro feito um cão
é hora dessa cidade ter vida, cores e alegria
pois parece bolacha murcha e embolorada como um pão
então vamos, vamos ter vida, cores e alegria
carrego cá a simples solução
então vamos, vamos que a felicidade nos espera
quem quer ser feliz dê um grito e levanta bem alto a mão”
Poucas pessoas levantaram, bem poucas mesmo
mas o palhaço insistia
fazia aos pulos e piruetas
o povo rir e mais mãos se levantarem
as crianças ouviram a algazarra e abriram as janelas
e corriam as ruas gritando “um palhaço, um palhaço”
e ele distribuiu bexigas em forma de animais
e balas e doces que enchiam as almas daquele povo
fazia rosas aparecerem atrás das orelhas
escondia moedas que apareciam nas carteiras
e escorregava e tropeçava em cascas de banana
Então as pessoas se alegraram
e a cidade ganhou cor, flores e sorrisos
as pessoas sorriam quando diziam bom-dia
as janelas estavam sempre abertas
e as ruas repletas de crianças e de risos
Então o palhaço pensou consigo:
“minha missão está cumprida
e as pessoas lembraram o que é ser feliz
e como viverem com dignidade”
Arrumou suas coisas e partiu
deixando um rastro colorido e brilhante atrás
No outro dia as pessoas se perguntavam
“onde está o palhaço? Pra onde ele foi?”
e assim fizeram no outro dia e no outro
mas não conseguiam achá-lo mais
emudeceram-se nas janelas e com a esperança
de que amanhã ou depois acordariam com a buzina
mas ele não voltava
e, lentamente, as crianças voltaram as suas casas
para brincar com os jogos modernos e computadores
as pessoas andavam apressadas novamente
lendo um jornal com um café e de cabeça baixa
rápidos demais para dar bom-dia ou sorrir para cumprimentar
Os animais foram embora novamente
e as flores murcharam e a cidade perdeu o colorido
cada um sentia novamente a apatia e a falta de alegria
como uma chaga escondida dentro do corpo
e o desespero como um câncer devorando a alma
Esperaram eternamente que o palhaço retornasse
para lhes dar alegria e satisfação novamente
mas ele nunca voltou aquela cidade
e as pessoas de lá nunca aprenderam a lição.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Doce, minha doce freira doce

Procura uma freira que te desentupa?
diga a graça, boca-do-inferno
desentupa o cano ou o escorregador de Pelé?
da minha parte, prefiro meu cano
mas cada qual se excita da maneira que prefere
mas quão interessante é a situação
desentope-se com a boca de veludo divina
ou se entreabre aos dedos de nossa senhora?
pensa: está ainda na vantagem
porque não tiveram a idéia de te sentar na cruz ou no prego
tão pouco de lhe enfiarem pelo reto a coroa de cristo
Pelo menos que a freira tenha a fala mole
ou que gema tal cabrita no cio
se ousar evangelizar no ato do gozo
sacaneia-lhe e lhe goza a cara com a pica
Ah, sinta-se cálida e plena, dona freira
que carrego cá minha chave divina
para o cadeado do céu que te habita entre as pernas
meto-lhe, giro e abro as portas do paraíso
Como teu corpo é lindo, ah, como ele é lindo
esse adorno pneumático que chama de cintura
sustenta, corajosamente, as bandejas da barriga
que, por sua vez, não menos honrosas
firmam e desafiam a gravidade de suas tetas
Ah, e que tetas
um combate ferrenho para ti, eu sei
quando cavalgas teu homem e as bandejas se distraem
pesadamente afogam teu par em uma imensidão de celulite
“celulite divina”, diria de passagem
“mas não menos afogado”, diria o teu par
Tua culpa, dona freira
meus pensamentos se formam de acordo com teu rebolado
e os mistérios que carrega embaixo da batina
malfadado foi o dia, talvez pela ira divina
em que o vento sorrateiro e endiabrado
meteu-se por dentro de tua indumentária
e ergue-lhe aos cabelos tua saia
Acompanha-me nas caminhadas vespertinas
e nas rezas, e nas missas, e nas festas
mas não arrebita assim teu quadril convidativo
enquanto te ajoelha no milho em penitência
pois não controlo a ansiedade ao ouvir tua “ave-maria”
e acabo enfiando-lhe a espiga sem avisos
Ah, que indelicadeza minha, dona freira
meus sentimentos e meu respeito a ti
não sou insensível, hei de lhe provar
pede perdão que eu também lhe perdôo
clama a luz que eu acendo a lanterna
deixa Jesus entrar em ti e na tua vida
pois, independentemente por onde ele entra
sei que me sobram duas entradas no mínimo.

sábado, 1 de novembro de 2008

Pérolas do ENEM 2008... proibido para menores de 14 anos

>> As pérolas do ENEM 2008:

01) “o problema da amazônia tem uma percussão mundial. Várias Ongs já se estalaram na floresta.”

02) “A amazônia é explorada de forma piedosa.” (…)

03) “Vamos nos unir juntos de mãos dadas para salvar o planeta.”

04) “A floresta tá ali paradinha no lugar dela e vem o homem e créu.”

05) “Tem que destruir os destruidores por que o destruimento salva a floresta.”

06) “O grande excesso de desmatamento exagerado é a causa da devastação.” (pleonasmo é lei!)

07) “Espero que o desmatamento seja instinto.” (…)

08) “A floresta está cheia de animais já extintos. Tem que parar de desmatar para que os animais que estão extintos possam se reproduzirem e aumentarem seu número respirando um ar mais limpo.”

09) “A emoção de poluentes atmosféricos aquece a floresta.” (nossa...)

10) “Tem empresas que contribui para a realização de árvores renováveis.”

11) “Animais ficam sem comida e sem dormida por causa das queimadas.”

12) “Precisamos de oxigênio para nossa vida eterna.”

13) “Os desmatadores cortam árvores naturais da natureza.”

14) “A principal vítima do desmatamento é a vida ecológica.”

15) “A amazônia tem valor ambiental ilastimável.”

16) “Explorar sem atingir árvores sedentárias.”

17) “Os estrangeiros já demonstraram diversas fezes enteresse pela amazônia.” (ÃHN?)

18) “Paremos e reflitemos.” (beleza...)

19) “A floresta amazônica não pode ser destruída por pessoas não autorizadas.”

20) “Retirada claudestina de árvores.”

21) “Temos que criar leis legais contra isso.”

22) “A camada de ozonel.”

23) “a amazônia está sendo devastada por pessoas que não tem senso de humor.”

24) “A cada hora, muitas árvores são derrubadas por mãos poluídas, sem coração.” (…)

25) “A amazônia está sofrendo um grande, enorme e profundíssimo desmatamento devastador, intenso e imperdoável.” (campeão da categoria “enchedor de lingüiça”)

26) “Vamos gritar não à devastação e sim à reflorestação.”

27) “Uma vez que se paga uma punição xis, se ganha depois vários xises.”

28) “A natureza está cobrando uma atitude mais energética dos governantes.”

29) “O povo amazônico está sendo usado como bote expiatório.”

30) “O aumento da temperatura na terra está cada vez mais aumentando.”

31) “Na floresta amazônica tem muitos animais: passarinhos, leões, ursos, etc.” (…)

32) “Convivemos com a merchendagem e a politicagem.”

33) “Na cama dos deputados foram votadas muitas leis.”

34) “Os dismatamentos é a fonte de inlegalidade e distruição da froresta amazonia.”

35) “O que vamos deixar para nossos antecedentes?” (dicionários)

36) “A fiscalisação tem que ser preservativa.”

37) “Não podem explorar a Amazônia de maneira tão devassaladora.” (neologismo pra devastadora + avassaladora)

quarta-feira, 22 de outubro de 2008


Censura consciente dos desejos coletivos

Eu conheço um cara que conhece um cara que é amigo de um cara
por definição, o cara que é o cara é o último
e eu sou o mais patético da lista
não conheço ninguém a não ser um cara que conhece um cara e é amigo de um cara
sim, isso é patético
e este é um começo patético de uma patética poesia
mas deixem-me: hoje estou patético
e não quero sentir as tamborilações cardíacas em seu colo
tenho uma capacidade infinita de ser amável
no mesmo nível de ser um completo cretino
engraçado, uma capacidade incomensurável da contradição
triste pensar assim
mas quero estar assim hoje
quero me sentir miserável, quero me sentir dramático
quero ser fresco, infantil, fútil e imbecil
tudo porque não sou o cara
Acham mesmo que tenho necessidade do amor? Sim, eu tenho
assim como tenho necessidade da amargura
assim como dói sem motivo algum para doer
e eu nem sei onde que dói então a chamo de angústia
como não sei de onde a angústia vem também a chamo frescura
e escondo todas minhas necessidades no fundo da gaveta
junto com meus escapes farmacológicos
Saia de perto de mim, quem lhe chamou aqui?
vá consolar a sua avó, seus cachorros ou sua bunda
de melodrama já me basto, de cuidar de mim já me sirvo
e isso tudo é tão ridículo que sequer consigo escrever sem me sentir estúpido
Mas adiante, o show tem que continuar
que tipo de palhaço é esse cuja intepretação não satisfaz o público
que esperam que seja você só sorrisos, só afabilidades
quando não o são, minuciosamente o investigam
fingem anseio, fingem preocupação, fingem de tudo
te querem bem? há, a piada do século
a ansiedade parte da necessidade embutida de que
as relações sociais da humanidade se baseiam na interação química sentimental
e que, moralmente, devem se preocupar com você
não os diga como se sentem: é cutucar um balão de gás com uma brasa incandescente
se indignam: você não pode ser assim
se ofendem: você não gosta de mim
se martirizam: eu não sirvo pra nada mesmo
e o teatro do melodrama barato se mantém
e eu que queria ser apenas autêntico e esquisito
sou motivo pleno do empirismo malfadado das relações humanas
tão doce que de tão doce é amargo
e isso é mais besta ainda, o doce é sempre doce
o que varia são as tonalidades do paladar na degustação
e, assim, o amargo é sempre amargo
Não me toquem, maldição, saiam daqui
que diabos de insistência inútil, insistem no teatro mágico
"eu tenho um cara mas que não é um cara como você
você sempre será meu cara mas quero o outro cara
porque este cara oferece-me espaço e você está sempre sozinho"
ah, que rebelde... deveria ficar tocado?
o que esperam? de que forma querem que eu aja?
fique triste? fique tocado? fique inutilmente inconsolável?
tenho mais o que fazer como cagar
portanto, se os desagrado vazem daqui
vão para o diabo, ou melhor, deixem-me ir para o diabo junto com o Fernando Pessoa
"ei, Sr. Pessoa, espera-me na esquina do lago
que Gil Vicente está a nos esperar na barca do inferno, impacientemente"
Ah, que desespero, eu admito
que falta soberba de conteúdo e drama excessivo
"reaja, maldito, reaja
não fique com essa cara imbecil de que está tudo bem
pode chorar, vamos, diga que está magoado sim
esperneie, berre, xingue, seja senil
mas, cacete, faça alguma coisa, qualquer coisa"
e os gritos e as vozes cessam
mergulhando-me na tormenta doce do silêncio
e limito minhas reações, meu espaço, minha culpa
minha placidez, meu vazio, minha inocência
a nada... e a tudo também
acende meu cigarro, Augusto
que eu escarro e apedrejo
esses sentimentos vis e falsos que me oferecem
que eu tanto anseio, que eu tanto desprezo
que eu tanto preciso, que eu tanto repudio
e me faz humano, nada mais mas nada de menos
nada mais abstrato, nada mais metafísico
nada mais concreto, nada mais palpável.

quinta-feira, 16 de outubro de 2008

Falsas ilusões do momento

Não se justifique porque não se justifica
não rola essa de falar que me ama sendo que não me ama
tão pouco disfarçar uma situação malfadada e precoce
onde os hormônios falam mais alto quando diz que me ama
não me ama, mas quimicamente me deseja
e se confude e me confunde também
e me engana e se engana também
e me trepa, e me malha, me goza inteiro
mas não cuida, não trata, não cicatriza
nem limpa o sangue ou me devolve o sono
ou fala as notas da música ou tira o sutiã
só vejo os olhos, nada mais que os olhos
verdes, esmeraldas, cor de vagem e cheiro de hortelã
loira, loirissima, a água oxigenada encarnada
e é tão bela, ah, é tão bela
e é tão falsa, ah, tão falsa
por falsos amores verdadeiros
em ilusões reais e não concretas
como um silêncio eterno de um canto sublime
e uma nota musical mal posicionada na orquestra
tão bela quanto castelos construídos em solo irregular
tão feia quanto rosas que nascem entre os entulhos
uma amostra singular da química fértil que é a vida
e o erro genético da evolução mal adaptada
não sabe qual o seu motivo, não sabe qual a direção
só conhece o sabor do pão e do açucar de um café
tamborila com uma gaita sonoridades diversas
mas a gaita não foi feita para tamborilar, e isso é ridículo
mas quem sabe também? e por que julgar então?
se não se julga quem sou eu pra fazê-lo
então peço, não me sorria assim
também não me olhe dessa forma encantadora
que esse encanto é falso, o sentido é falso
e o seu sorriso é desprovido de contéudo
porque eu que crio esses sentidos, não você
fazendo das suas razões as minhas, nunca suas
e te torna tão falsa quanto as razões que eu racionalizo, ou anseio
que jeito meigo, que doçura, que encanto
que doidera, que loucura, que besteira
e ainda me dá um toque
"ficou um pedaço de papel na sua testa"
imagine então quando ficar uma alface no meio dos dentes
se mantenha plácida, se abstenha, se mantenha impecável
se não entendeu, cala a boca e fica quieta
que muito belo permanece quem não abre a boca
e se mantém incólume na empolgação da verborragia
ah, mas essa parte se dirige a mim e não a ela
que fala muito e age pouco
e, estupidamente, fica buscando sentidos e mais sentidos
e não existem esses sentidos, só sentidos
que são somente sentidos, que se sentem e não precisam ser entendidos
por isso são sentidos e nada mais
e me escondo através de um intelecto ilusório e narcísico
quando tenho vontade de ser somente estúpido e fútil
e falar sobre coisas estúpidas e fúteis
e ser fútil e estúpido
ah, como ela é bela e preciosa
como é suave, como é senhora de si
como ventos que trazem doces sensações de sonhos improváveis
e músicas tortuosas que inflamam os sentidos materiais
como um banho de sabonete voluptuoso e de sentimentos anti-caspa
onde os movimentos ondulantes distorcem a realidade
e a fumaça dos incensos traçam figuras apaixonadas e mal-definidas
dimensionando todas as cores e brincando como criança
entre desejos que não se concretizam e vivem a mercê das expectativas
em uma paquera inteminável de 15 anos de idade
e na sabedoria da velhice e a placidez que a sabedoria traz
na impaciência do gozo que nunca chega
retraindo os músculos do corpo e ricocheteando na virilha
é dona do momento, da ocasião premeditada
na infantilidade sádica dos iconoclastas
nos concretiza os sonhos e os destrói ao mesmo tempo
e toca os rebanhos, e toca o moinho da vida
desaba e se levanta somente para desabar de novo
para ter que levantar novamente e dar continuidade ao ciclo da existência
ah, como ela é forte, ah, como ela é frágil
como é dona de tudo e ao mesmo tempo não é nada
um conta-gotas no oceano nos milhões dos milênios da vida
como grãos de ouro e de prata que representam os sentimentos
mas não são nem dourados ou de prata e não representam nada
são somente grãos de areia e por isso são importantes
por serem apenas grãos de areia e por isso são coerentes
sinceros e representam tudo
então não me sorria nesse vestido rosa e com os olhos de limão
que, aliás, pensei que fosse um vestido de gala e ocasião
e os limões adocicados e curtidos na vodca
que me tira o sono, a coerência e a lógica
e me torna inquieto, contraditório e sentimental
e fraco, e forte, e tortuoso, e realizado
e perfeito, e falho, e homem, e criança.

domingo, 7 de setembro de 2008

Os avanços modernistas

Fecha a porra do portão, Colombo

que lá vem o negão, cheio de razão

te catar, te catar, te catar

querendo cortar a tua bingulinha

nem o teu cabaço ele perdoa não

Quem mandou trazer a civilização?

e o conceito do pré-conceito?

Ah, mas o estrago já foi feito

e deu-se uma destrambelhada inovação

e toda europa e o caralho a quatro

acharam supimpa a idéia da expansão naval

pronto: troca-se a tanga pelo jeans

e o purê de banana pelo big mac

e alto esbravejam: cá temos a solução

a civilidade, a modernidade e a matéria bruta do conhecimento científico

dou-lhes quinquilharias, trajes sem valor

douradas, reluzentes, fulgurantes

ouro de tolo, o sal dos apóstolos

e todo o arroz tributado do japão

Trago esta rosa singela

bela, colhida do poema de Hiroshima

brilha muito, é pomposa e meiga

nutrida da pele, da carne, da genética daquele povo

e sustentada pela radiação daquela terra

Só peço, companheiros, que abram o portão da sua cultura

que esqueçam sua identidade e sua linguagem

que abandonem sua religião e orgulho

e escancarem sua subjetividade para a democracia

Pelo povo, para o povo, com o povo

igualdade, fraternidade, liberdade

e votem no Lula para presidente

E abriram. Pior ainda: e votaram

resultado: o Brasil

meu Brasil brasileiro

não do mulato, só do estrangeiro

vou cantar-te nos meus versos

Brasil, terra que dá

recursos para explorar

mas não fica nada aqui não

pra onde é que vai então?

Vai pra cima, bem pra cima

onde é dia e aqui é madrugada

Radical: madruga, do seriado do Chaves

"pi, pi, pi" chora o Brasil"

cale-se, cale-se, você me deixa louco"dizem os norte-americanos

"gentalha, gentalha, pfffff"a união europeia"

só não te dou outra porque..."diz Evo Morales

até o cocaleiro desce o sarrafo na gente, veja só

Ah, os benefícios da modernidade, da modernidade

que, de tão moderna, chamam-na modernidade

pois é moderna, então o apelido se torna óbvio

nada mais formal, nem menos aristotélico

"a" é igual "a", "a" não é igual a "b"

pronto: e foda-se o terceiro excluído

a melhor vigilância é a que se interioriza

é no medo e nos ideais pré-estabelecidos

que o controle se acomoda e determina

Ah, se ousarem se rebelar

ligo pro meu psiquiatra e encomendo um transtorno novinho

via sedex com AR pra confirmar o recebimento

super-chique falar que tem transtorno

TDAH, TOC, DSM-IV, a bíblia psiquiatrica

o novo slogan mundial: você tem o que?

"eu sou feliz" e gritam "transtorno, transtorno"

"eu sou do PCC" "TRANSTORNO, TRANSTORNO"

"hã... eu tenho direitos sociais?" "PSICOSE, PSICOSE"

de quem é essa voz que grita, obriga, vomita em nossas mentes?

de quem é essa rédea que nos limita, restringe e domestica

?de quem? de quem, maldição, de quem?

"Eu sou a cultura imposta, o segregador das relações

eu sou o seu suspiro, sua mácula, seu pensamento

eu sou a sua vergonha, seu sorriso, sua lágrima

eu sou o seu anseio, seu sucesso e fracasso

eu sou o seu gerador, seu caminho, seu destino

eu sou a sua realidade, seu domínio, seu remédio

eu sou o seu pai, sua mãe, sua família

para onde quer que olhe você me vê

onde quer que você respire você me traga

o buraco que tropeça sou eu que cavei

e a tristeza que sentem no seu enterro

bah, fui eu que inventei

seu descanso final? inferno ou paraíso?

fui eu que criei

seu pensamento, sua conduta, seu comportamento

eu determinei

o que chamam de amor, tristeza ou sentimento?

admitam, nesses eu fui muito criativo

olha só o faturamento da Casas Bahia

Qual o meu nome? Esse vocês que inventaram: Modernismo.