segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

Conto de fadas capitalista

Uma vez em uma cidade
um palhaço um dia veio
e se espantou com a tristeza das pessoas
a cidade toda cinza, sem música ou alegria
as expressões sérias, as janelas fechadas
as crianças trancadas em casa e sem animais andando pelas ruas
E o palhaço não conseguia acreditar no que via
“o que acontece com essa cidade
que não tem cor, que não tem riso e vida?
não entendem que o certo é viver
cada dia, cada momento
com prazer, amor e felicidade?”
E então tocou forte sua buzina
chamando a atenção dos moradores que passavam
“cá estou, o palhaço Jotalhão
faço piruetas, planto bananeira
dou cambalhotas e me estatelo no chão
conto piadas, truques de magia e cabriolagens
imito um macaco e corro de quatro feito um cão
é hora dessa cidade ter vida, cores e alegria
pois parece bolacha murcha e embolorada como um pão
então vamos, vamos ter vida, cores e alegria
carrego cá a simples solução
então vamos, vamos que a felicidade nos espera
quem quer ser feliz dê um grito e levanta bem alto a mão”
Poucas pessoas levantaram, bem poucas mesmo
mas o palhaço insistia
fazia aos pulos e piruetas
o povo rir e mais mãos se levantarem
as crianças ouviram a algazarra e abriram as janelas
e corriam as ruas gritando “um palhaço, um palhaço”
e ele distribuiu bexigas em forma de animais
e balas e doces que enchiam as almas daquele povo
fazia rosas aparecerem atrás das orelhas
escondia moedas que apareciam nas carteiras
e escorregava e tropeçava em cascas de banana
Então as pessoas se alegraram
e a cidade ganhou cor, flores e sorrisos
as pessoas sorriam quando diziam bom-dia
as janelas estavam sempre abertas
e as ruas repletas de crianças e de risos
Então o palhaço pensou consigo:
“minha missão está cumprida
e as pessoas lembraram o que é ser feliz
e como viverem com dignidade”
Arrumou suas coisas e partiu
deixando um rastro colorido e brilhante atrás
No outro dia as pessoas se perguntavam
“onde está o palhaço? Pra onde ele foi?”
e assim fizeram no outro dia e no outro
mas não conseguiam achá-lo mais
emudeceram-se nas janelas e com a esperança
de que amanhã ou depois acordariam com a buzina
mas ele não voltava
e, lentamente, as crianças voltaram as suas casas
para brincar com os jogos modernos e computadores
as pessoas andavam apressadas novamente
lendo um jornal com um café e de cabeça baixa
rápidos demais para dar bom-dia ou sorrir para cumprimentar
Os animais foram embora novamente
e as flores murcharam e a cidade perdeu o colorido
cada um sentia novamente a apatia e a falta de alegria
como uma chaga escondida dentro do corpo
e o desespero como um câncer devorando a alma
Esperaram eternamente que o palhaço retornasse
para lhes dar alegria e satisfação novamente
mas ele nunca voltou aquela cidade
e as pessoas de lá nunca aprenderam a lição.